Vozes femininas sobre a prisão: uma análise do sistema carcerário brasileiro a partir das obras Prisioneiras 2017 e Olha para elas 2023

Abstract

Esta tese analisa o encarceramento feminino no Brasil por meio de produções estéticas que abordam as vozes de mulheres cisgêneras encarceradas, evidenciando as condições de um sistema prisional concebido para homens. Diante disso, O problema de pesquisa centra-se nos impactos do encarceramento feminino, considerando as violações de direitos fundamentais reconhecidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) como um "estado de coisas inconstitucional" na ADPF 347, e nas condições de vida das mulheres em privação de liberdade. A pesquisa busca explorar como obras estéticas podem revelar, problematizar ou ressignificar essas experiências, destacando as punições adicionais enfrentadas por mulheres nesse contexto. Além disso, para atingir o objetivo principal, investiga o Habeas Corpus Coletivo nº 143.641/SP, que estabelece a substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar para mulheres em situações específicas, analisando como essa medida reflete na garantia e na proteção dos direitos dessas mulheres. Assim, a metodologia combinou análise documental e estudo crítico de obras estéticas, utilizando relatórios do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de 2021 e 2022, entrevistas de mulheres presas, agentes penitenciários e familiares no livro “Prisioneiras” (2017), de Drauzio Varella, e o documentário “Olha pra Elas” (2023), de Tatiana Sager e Renato Dornelles. Os resultados apontam que, embora o Habeas Corpus Coletivo represente avanço, sua aplicação prática enfrenta desafios. Muitas mulheres aptas à medida continuam presas, e as condições nos presídios, como superlotação e ausência de atendimento médico, persistem. Três grandes discrepâncias emergiram: o perfil das mulheres presas — predominantemente negras, pobres e com baixa escolaridade; ilegalidades perpetradas por agentes estatais; e o impacto do encarceramento na estrutura familiar, feminilizando a violência, o abandono e as responsabilidades financeiras. As violações de direitos incluem o rompimento familiar e a ausência de políticas adequadas de maternidade, perpetuando ciclos de exclusão social e marginalização. A pesquisa evidencia que o enclausuramento físico é apenas uma das múltiplas violências enfrentadas. Por fim, a tese propõe a reavaliação do sistema prisional brasileiro, considerando as condições desumanas e o perfil das mulheres encarceradas, contribuindo para o debate sobre justiça social e desencarceramento, com foco em políticas públicas inclusivas e humanizadas.

This thesis examines female incarceration in Brazil through aesthetic productions that address the voices of incarcerated cisgender women, highlighting the conditions of a prison system designed for men. Accordingly, the research problem focuses on the impacts of female incarceration, considering violations of fundamental rights recognized by the Supreme Federal Court (STF) as a "state of unconstitutional affairs" in ADPF 347, and on the living conditions of women deprived of liberty. The study seeks to explore how aesthetic works can reveal, problematize, or reinterpret these experiences, emphasizing the additional punishments faced by women in this context. To achieve its primary objective, the research also investigates Habeas Corpus No. 143.641/SP, which establishes the replacement of pretrial detention with house arrest for women in specific circumstances, analyzing how this measure reflects on the guarantee and protection of their rights. The methodology combines documentary analysis and critical study of aesthetic works, utilizing reports from the National Justice Council (CNJ) from 2021 and 2022, interviews with incarcerated women, prison staff, and family members in the book Prisioneiras (2017) by Drauzio Varella, and the documentary Olha pra Elas (2023) by Tatiana Sager and Renato Dornelles. The results indicate that, although the Collective Habeas Corpus represents progress, its practical application faces challenges. Many women eligible for the measure remain imprisoned, and conditions in prisons, such as overcrowding and lack of medical care, persist. Three major discrepancies emerged: the profile of incarcerated women— predominantly Black, poor, and with low levels of education; illegal actions perpetrated by state agents; and the impact of incarceration on family structures, exacerbating violence, abandonment, and financial responsibilities. Rights violations include family disruption and the lack of adequate maternity policies, perpetuating cycles of social exclusion and marginalization. The research underscores that physical confinement is only one of the multiple forms of violence faced by incarcerated women. Finally, the thesis proposes a reevaluation of the Brazilian prison system, taking into account the inhumane conditions and the profile of incarcerated women. It aims to contribute to the debate on social justice and decarceration, emphasizing the importance of inclusive and humanized public policies.